A notícia de que a agência de classificação de risco S&P Global Ratings elevou a nota de crédito do Brasil de estável para positiva deu ainda mais fôlego para um mercado que já vinha animado.
Neste mês, com base no fechamento do dia 19, o Ibovespa, principal índice de ações da bolsa de valores brasileira (B3), já subiu quase 10%, e está muito próximo dos 120 mil pontos.
O dólar, por sua vez, acumula queda de mais de 5%, menor patamar em um ano e abaixo dos R$ 4,80. Na última sexta (16), inclusive, o banco Goldman Sachs reduziu suas projeções para a moeda americana em 2023, considerando que deve fechar o ano a R$ 4,40.
Segundo especialistas ouvidos pelo g1, o sentimento positivo com o mercado brasileiro nas últimas semanas pode ser explicado, sobretudo, pelos seguintes motivos:
- ???? a volta do investidor local aos ativos de risco, principalmente o institucional;
- ???? a permanência dos investidores estrangeiros no mercado doméstico;
- ???? a desaceleração da inflação acima do esperado;
- ???? uma maior clareza sobre os rumos da política fiscal no país;
- ???? a perspectiva de que a Selic, taxa básica de juros, deve começar a cair em breve;
- ???? a perspectiva de que a trajetória dos juros nos Estados Unidos também deve desacelerar.
A volta do investidor local combinada à permanência do estrangeiro no mercado doméstico tem sido o principal impulsionador para o bom desempenho observado nos últimos dias. E a renovação desse interesse, por sua vez, se deve às perspectivas envolvendo a inflação, os juros e a política fiscal no Brasil, além dos rumos da política monetária nos Estados Unidos.
Com a inflação mais controlada, a expectativa é que o Banco Central do Brasil (BC) comece a reduzir a taxa Selic. Se os juros ficam menores, a renda fixa passa a entregar uma rentabilidade também menor e isso favorece a migração de recursos para ativos que podem compensar essa redução. Entre eles, o mercado de ações.
A definição de um novo arcabouço fiscal ainda contribui com essas projeções, pois traz a perspectiva de que os gastos do governo estarão mais controlados — ponto positivo para a expectativa de inflação e, consequentemente, para os juros.
Por fim, o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) interrompeu seu ciclo de alta nas taxas de juros em sua última reunião e, apesar de alertar que pode voltar a subi-las se a inflação se mostrar mais persistente, aumentou o apetite por ativos de riscos por parte dos investidores.
Isso porque, se os juros sobem por lá, a renda fixa no país também fica mais atrativa. Porém, como os títulos públicos americanos são considerados os mais seguros do mundo, uma alta nas taxas dos Estados Unidos leva a uma saída dos investidores de mercados emergentes, como o Brasil.
Neste sentido, o otimismo com a bolsa e a moeda brasileira voltou a levantar um questionamento entre os investidores: o mercado nacional é a bola da vez, quando comparado ao exterior?
Quem está investindo no Brasil hoje?
Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, destaca que, no começo do ano, quem sustentou o mercado nacional foi estrangeiro, com as expectativas que tinham quanto ao novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em contrapartida, o que se vê agora é um retorno do investidor local, que voltou a investir no país com a percepção de que os rumos da economia podem ser mais positivos do que o esperado.
Os principais investidores do Brasil atualmente são os estrangeiros, com cerca de 53,9% do mercado. Os investidores institucionais locais (que são os bancos, empresas ou pessoas com grandes fortunas), têm 27,7% de participação, e os investidores pessoa física, 13,9%. Os dados são de um levantamento da XP.
Isso mostra que os estrangeiros são os grandes “donos” do Ibovespa, mas não significa que o investidor internacional investe muito no Brasil, explica o analista CNPI Vitor Miziara. Na verdade, o montante destinado ao país ainda representa uma pequena fração dos investimentos globais e esse valor pode oscilar muito com base em uma série de fatores, inclusive externos.
Isso aconteceu no mês de maio, por exemplo: apesar do bom desempenho do Ibovespa, o fluxo de capital estrangeiro foi negativo, com uma saída de cerca de R$ 4,2 bilhões dos ativos domésticos. Segundo Lucas Serra, analista da Toro, esse movimento foi puxado, sobretudo, pelos riscos envolvendo a renegociação do teto da dívida americana, que deixou os investidores receosos.
Guerras, crises políticas, pandemias e a própria movimentação dos juros nos países desenvolvidos, principalmente os Estados Unidos, são motivos externos que podem impactar a entrada de dinheiro estrangeiro no Brasil. Momentos de instabilidade fazem com que o mercado dê preferência para ativos seguros, minimizando as perdas.
Em contrapartida, no acumulado de 2023 até o mês passado, o fluxo internacional continua positivo em R$ 9,5 bilhões, enquanto as projeções para junho já indicam um retorno do estrangeiro.
Já os investidores institucionais voltaram a alocar seus recursos no Brasil e o país registrou uma entrada de R$ 2 bilhões, com a melhora na perspectiva para a política fiscal e as projeções de quedas nos juros (leia mais abaixo).
Conforme explica Jennie Li, estrategista de ações da XP, o que isso mostra na prática é que o bom desempenho do Ibovespa nas últimas semanas pode ser explicado como uma combinação entre tudo o que os investidores estrangeiros já aplicaram neste ano, apesar da queda em maio, e a volta do investidor nacional à bolsa de valores.
Inflação, juros e arcabouço fiscal
A inflação já começa a dar sinais melhores para o país. Na última divulgação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) avançou 0,23% em maio, muito abaixo das expectativas de mercado e com uma forte desaceleração em relação aos meses anteriores.
A principal consequência disso é o aumento das expectativas de que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC comece um ciclo de corte de juros já nos próximos meses. Hoje, a taxa Selic está em 13,75% ao ano.
Miziara comenta que as projeções para a taxa de juros já em 2024 apontam para 11% ao ano e essa perspectiva de queda foi uma das principais responsáveis por trazer de volta os investidores institucionais para a bolsa brasileira.
“Com a queda de juros, o investidor brasileiro vai procurar formas de trazer mais rentabilidade à carteira. A bolsa é uma saída para aproveitar a queda de juros, e também pelo desempenho das ações. Com juros menores, há um menor custo financeiro em dívidas, o que pode gerar mais lucros para as empresas”, explica o analista.
O outro ponto importante tanto para a volta dos investidores internos como para a maior atração dos estrangeiros é o arcabouço fiscal.
Jennie Li, da XP, destaca que a proposta apresentada pelo governo não é a ideal do ponto de vista dos economistas e outros especialistas do mercado, mas que já traz uma maior visibilidade para a questão da importância do controle dos gastos públicos. Isso já anima os investidores, que entendem que o controle dos gastos traz uma tendência de inflação também controlada.
Daniel Moura, especialista em mercado de capitais, compartilha da mesma visão e complementa: “Ao que tudo indica, a nova regra é mais permissiva, porém permite uma continuidade da melhora fiscal que tivemos nos últimos anos. Em resumo, se o Brasil seguir com boas reformas, principalmente onde se trata do fiscal, tem tudo para se tornar a bola da vez”.
FONTE G1 link original